domingo, 26 de agosto de 2012

Apresentando-me ao posto

Na chegada ao humilde posto de saúde Amador Cândido de Camargos fica evidente a natureza simples e precária do atendimento que se presta a comunidade em seu entorno. Explicita como nosso país possui um modelo de saúde invejável no papel que, entretanto, ainda não conseguiu alcançar o mesmo patamar de excelência quando posto em prática – uma pena.
Desde nossa chegada recebemos pedidos de desculpas mil por tais precárias condições, mas seria realmente a nós a quem esses pedidos de desculpas deveriam estar dirigidos? Como estudantes de medicina estamos aqui para enfrentar a dura realidade que permeia o cotidiano de trabalho e nos poupar disso somente criaria a falsa impressão de que “tudo vai bem, obrigado”.
Pois então, a quem deveríamos nos desculpar? Ora, não é óbvio? A verdade é que quem sofre com essa situação está bem a nossa frente: as famílias que recorrem a esse serviço e dependem dele para manter o bem estar de seus membros de forma individual e conjunta. Como esperar eficiência no atendimento se para marcar uma consulta o doente tem de acordar em plena madrugada para pleitear uma senha para tal, sempre muito escassas, e se não a consegue tem de se conformar, voltar para casa e esperar uma nova tentativa.
Prosseguimos em nossa visita e fomos apresentados as agentes de saúde que deveremos acompanhar até o fim do semestre para que conheçamos algumas das famílias que participam do PSF (Programa Saúde da Família). Cada um de nós, com sua respectiva agente de saúde, foi incumbido em caminhar por determinada porção do raio de atuação do posto. Ali começou o verdadeiro confronto com a realidade.
Numa mesma rua pude ver como as casas se misturavam. Havia sim casas que ostentavam adornos um pouco mais elaborados e se mostravam bem pintadas e cuidadas, ao lado delas sempre era visível a quebra do padrão por construções verdadeiramente simples e que se pareciam doentes quando comparadas as primeiras. Era quase como se as construções evidenciassem a realidade que encerravam por dentro de suas paredes e, aos poucos, iam se tornando um reflexo do que guardavam.
Não vou aterme aqui em cada uma das casas que visitei. Porém, posso dizer que a maior necessidade de todas que vi nesse dia foi a carência. Não entenda isso como falta de dinheiro ou coisa parecida – não que ela também não exista –, me refiro a necessidade intrínseca do ser humano em sentir-se acolhido e amparado. Em ter uma motivação a seguir em frente, sentir-se como parte da comunidade e importante dentro de sua construção.
Qualquer um que trabalhe em ações sociais sabe bem a que me refiro e uma frase que escutei naquele dia traduz isso da maneira mais simples que poderia pensar. Uma senhora me disse: “Venham mais vezes aqui em casa, gosto mais das conversas do que dos remédios”, aí está traduzida a verdadeira necessidade humana da qual me referia no paragrafo anterior. Essa é a essência desse tipo de trabalho o contato direto com o paciente para garantir que não só sua saúde física e mental esteja satisfeita, mas também sua saúde social. Afinal de contas toda conversa é também um remédio.
A visão que temos não chega a cobrir nem a ponta do iceberg, a falta de estrutura dos postos afeta diretamente o bom trabalho do PSF. Ainda faltam profissionais em ambas as áreas, ainda falta uma melhor preparação de quem lida com áreas de risco, ainda falta ao governo prestar uma melhor assistência a esses profissionais para que possam atuar de maneira mais efetiva...
E se citasse aqui as tantas coisas que faltam resultaria em um texto infinito e esse não é meu objetivo. Quero simplesmente expressar meu olhar quando cheguei pela primeira vez ao posto de saúde, quero ter registrado minha visão para que no futuro eu não me esqueça, nem aceite que se torne comum, tudo o que eu vivi.

domingo, 19 de agosto de 2012